24 – 9 RACHEL ROXO DA MOTTA (Irmã Maria da Santa Felicidade, Irmã Rachel)

Nasceu em São Geraldo, como todos os irmãos, em 30/04/1923 e faleceu em Salvador, BA, em 11 de março de 2014. Era a caçula dos irmãos.

Falar sobre a tia Rachel é motivo de muitas emoção, saudades, lembranças, admiração, vários e bons sentimentos! Para começar, ela foi a responsável pelo meu nome!

Mamãe contava que ela lhe pediu que, se fosse uma menina, que desse o nome de Regina Helena, por causa de uma sua aluna que era muito amiga, estudiosa e de grandes qualidades! Engraçado é que eu nunca soube o sobrenome dessa aluna, nem a menor notícia sobre ela!

Também por sua influência eu pude estudar o antigo ginásio, em Viçosa. Na época São Geraldo não possuía senão o Grupo Escolar e, se fosse preciso pagar o colégio interno, meus pais não teriam condições financeiras.

Assim como as outras irmãs, foi estudar interna no Colégio Nossa Senhora do Carmo, em Viçosa, MG. Lá ela manifestou sua vontade de se tornar freira. Os pais exigiram que esperasse os 18 anos para ter certeza de sua vocação. Assim, aos 18 anos, foi para o noviciado da Ordem das Carmelitas da Divina Providência.

Fui para o internato neste mesmo colégio, em 1956, onde ela já era freira, com o nome de Ir. Felicidade. Era professora de Português. Durante dois anos nós convivemos, depois ela foi transferida para o Colégio Nossa Senhora do Carmo de Juiz de Fora.

Nesses dois anos, ela me ajudou muito, era rigorosa e exigente, mas sempre com muito carinho. Tentou muito fazer com que eu fosse mais organizada com meus objetos e menos questionadora, infelizmente sem sucesso!! Aos sábados havia a rotina de uma freira visitar o dormitório e fiscalizar o nosso pequeno armário individual e depois as carteiras da sala de aula onde guardávamos livros e cadernos. Antes desta fiscalização, ela me chamava no pátio de recreio e me levava com ela para que eu arrumasse minhas coisas (que sempre estavam mal arrumadas!).

Nós usávamos meias compridas de algodão durante todo o dia. Elas se rasgavam e havia um ovo de madeira para colocar dentro do pé da meia para facilitar o cerzimento. Era uma tortura para mim que nunca fui habilidosa para isto. Quando ela viu que não tinha jeito de ficar bem feito o cerzimento, recolhia minhas meias e as cerzia! Não queria que a sobrinha ficasse “mal vista”!!

Depois de sua saída de lá, trocamos algumas cartas que tenho guardadas e vou transcrever aqui.

Preocupava-se muito com toda a família, a ponto de, por interferência dela através de uma ex-aluna, conseguir a nomeação do papai para Coletor Federal em São Geraldo, numa época em que a nossa situação financeira era muito precária.

Sobre a sua infância e juventude em São Geraldo, não tenho relatos, só me lembro de uma historinha que a Tia Eunice me contou, da última vez que estivemos juntas: Disse-me que A Tia Rachel era muito vaidosa e que passava rouge no calcanhar quando calçava sandálias, para que parecesse rosado!

Na época em que houve o Concílio no Vaticano e que as regras para as congregações foram modernizadas, ela, que já havia feito os Votos Perpétuos, pediu autorização ao Papa para se transferir para a Ordem Beneditina, que era em regime de clausura.

Recebeu a autorização e se tornou Monja Beneditina, Irmã Rachel. Foi para o Mosteiro em Belo Horizonte, onde fui visitá-la por 3 vezes. Na primeira, havia duas grades de madeira entre a Monja e a visita, de forma que não havia nem mesmo a possibilidade de apertarmos as mãos. Depois já havia apenas um balcão, sem as grades.

De lá, foi para a cidade de São Sebastião do Alto, RJ, com mais duas freiras, para fundarem o Mosteiro de lá. Não sei exatamente quanto tempo permaneceu lá. Sei que de lá foi com outras duas para Salvador, onde foi fundado o Mosteiro em que ela viveu até o seu último dia.

Em Salvador fui visitá-la uma vez e já era bem mais aberto. Podíamos nos aproximar, passear um pouco pelas dependências do convento, excetuando a clausura.

Apesar de viver afastada de tudo, ela tinha um conhecimento espantoso e opiniões formadas sobre tudo que acontecia. Tinha um espírito muito crítico e irônico. Conversar com a tia Rachel era uma delícia!

Guardo comigo a última lição que me deu, quando esteve em Juiz de Fora, para visitar a família, em especial ao papai que já estava muito doente. Conversávamos e ela me contava que as pessoas da comunidade em torno do Mosteiro em Salvador frequentavam as Missas dominicais da Capela e que, um dia, uma delas lhe perguntou: – Irmã, o padre disse que temos que confessar os nossos pecados. O que é pecado?

E ela respondeu: – Pecado é tudo que é feito sem amor. Deus é amor então onde existe amor Ele está presente! Pecado é falta de amor!

Esta Crônica feita pelo Mosteiro de Salvador, que vou transcrever para facilitar a leitura, resume de forma magistral o que foi a vida da Irmã Rachel!

Crônica de Irmã Rachel Roxo da Motta OSB

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*30.04.1923 S. Geraldo – MG – + 11.03.2014

“Caros,

Estou me unindo a vocês neste momento de saudade da tia Rachel. Durante um tempo, nós a presenteamos com orquídeas as quais eram cuidadas pela irmã Maria Isabel. As mãos geradoras da irmã Maria Isabel as faziam florir como uma dádiva. Sempre que íamos visitar o Mosteiro, a irmã Rachel pedia a irmã Maria Isabel que trouxesse a que estava florindo. Hoje, tenho um quintal com árvores onde coloquei algumas orquídeas, que quando floridas, sinto a presença delas.

Enfim, a vida se transforma,

Um abraço, Conceição”

Com estas palavras de uma das sobrinhas de Ir. Rachel, que morou em Salvador e continua muitas vezes presente à comunidade, partilhamos alguns aspectos da rica personalidade de nossa Ir. Rachel, que partiu há dois meses para a Casa do Pai. No dia 30 de abril ela teria completado 91 anos. Sim, a vida se transforma… As orquídeas agora florescem também em nosso jardim, que muito fala da Ir. Rachel. Seu amor pela natureza começou desde seu nascimento na Fazenda do Caeté, da qual falava sempre!

Em um de seus escritos relata a alegria que sentia ao ver os montes ao longe. Seu coração começava pulsar diferente: “Era uma alegria pascal!”, escreveu. A fazenda, a estrada de ferro, as cavalgadas pelas colinas ao redor até as pequenas escola onde dava aulas às crianças vizinhas, o convívio familiar, recordações muito caras.

O pai, Luiz Ferreira da Motta, era um grande fazendeiro. Trabalhou com exportação de café. Nasceu em São Geraldo, MG, em 1868, filho de Luiz Manoel da Motta e Flávia Bibiana de Jesus. A mãe, Júlia Roxo da Motta, nascida no Brasil de pais portugueses marcou a família que conta com inúmeras Júlias em todas as gerações e foi figura determinante na personalidade de Ir. Rachel. Os avós paternos e maternos eram ambos portugueses.

O casal teve dez filhos, dos quais dois faleceram na infância e outro, aos 33 anos, o Diniz, cuja perda prematura foi sempre lembrada com saudade. Com a morte do pai, o irmão Luiz Roxo da Motta, Lizote, assumiu a direção da fazenda. D. Júlia, mãe carinhosa e firme, humana e com olhar positivo sobre a vida e seus mistérios. Seu falecimento deu-se nos primeiros anos de vida religiosa de Ir. Rachel e era relatado com muito sentimento. Os valores humanos, cristãos, éticos e o amor aos estudos, muito cultivados, marcaram toda a trajetória de Ir. Rachel.

A jovem Rachel estudou em São Geraldo e depois no internato do Colégio do Carmo, em Viçosa onde se formou em magistério. Chegou a dar aulas em São Geraldo. Quando estudante, disse ao pai que queria ser freira. Ele lhe respondeu que ela era muito jovem e que esperasse ficar adulta. Quando fez 18 anos ela procurou seu pai e disse: “Eu já sou maior de idade e quero mesmo ser freira” e seguiu para o noviciado carmelita. Depois deu aulas em Viçosa e Juiz de Fora.

A família sempre ocupou um lugar privilegiado em seu coração. Acompanhou o nascimento de cada um e seu desenvolvimento, de modo efetivo, mas misteriosamente guardando a direção de seu coração para a vida consagrada. Apesar de distante, os irmãos e sobrinhos sentiam-na muito próxima. Em Salvador, pode ter a presença de dois que aqui moravam e a visitavam regularmente, Fernando e Conceição e suas famílias. O carinho de todos manifestou-se em sua idade mais avançada, seja pelas visitas frequentes, como a do Lino, filho da Ena, que vinha com frequência de Brasília, seja pelos telefonemas, seja pelo apoio e conselho do sobrinho médico, Luiz Augusto. Fizeram todo o possível para ajudá-la em sua enfermidade. Nossa comunidade é profundamente grata a todos que formaram a rede de apoio, especialmente pela presença tão fiel do trio Conceição, Lino, Luiz Augusto.

Depois do núcleo familiar, a Congregação das Irmãs Carmelitas da Divina Providência, deu-lhe uma sólida formação. A amizade pelas co-irmãs era forte, o que tornou difícil dar o segundo passo, a entrada no Mosteiro de N.Sra. das Graças em Belo Horizonte, em 1968. Às vezes se referia a esta decisão como a um “arrancar de raízes”, algo quase como uma loucura! Mas o chamado à vida interior cada vez mais intenso guiou e seu itinerário e Ir. Rachel, dócil, o seguiu. Nela manifestava-se o amor em sua dupla dimensão, a Deus e ao próximo, intensamente.

Era uma pedagoga nata, de fácil aproximação aos corações de todas as idades. Crianças, adolescentes, jovens, casais, pessoas idosas, encontravam nela olhar e ouvidos atentos e calorosos. Foi assim que teve em uma de suas classes o pequeno Geraldinho, mais tarde Cardeal Geraldo Majella Agnelo, Arcebispo de Salvador, que muitas vezes a visitou com carinho e falava da jovem loura que o acolheu criança. A diferença de idade entre os dois era de dez anos. A retidão de seu caráter era total. Qualquer aluna que lhe levasse presentes, com eles voltava. Era intransigente neste ponto. Por outro lado, a compreensão dos corações, em seus  diversos estágios, lhe valeu tecer fortes laços de amizade. Muitas ex-alunas continuaram a procura-la depois de sair do colégio, para partilharem suas vitórias e dificuldades ao longo da vida. Quando se tornou monja beneditina assumiu os trabalhos da casa como todas as monjas e continuou a atividade pedagógica com as jovens que se hospedavam nos mosteiros ou as noviças, a quem dava aulas de português, tanto em Belo Horizonte como em Salvador. Referência constante para qualquer dúvida na língua, Ir. Rachel trabalhou como revisora das traduções de artigos e alguns livros e escritos de várias famílias religiosas que recorreram aos mosteiros.

Ao tempo em que entrou no Mosteiros N.Sra. das Graças, o Direito Canônico exigia das religiosas que ingressavam nos mosteiros o mesmo processo das jovens que entravam pela primeira vez. Ela abraçou o desafio e, celebrou como postulante beneditina o Jubileu de Prata da Profissão Religiosa, integrou-se ao grupo jovem de corpo e alma e participou pontualmente de todas as atividades, inclusive as lúdicas, que não faltavam. Eram conhecidos os autos representados pelo noviciado e Ir. Rachel comparecia sempre, bem como aos ensaios do Coral Tico-Tico – tinha todas as músicas anotadas! Ficou famosa sua interpretação de um Auto de Natal baseado em uma crônica de Maria Clara Machado. Ir. Rachel interpretava o “boi” do presépio e sua fala, ”sentia uma raiva, uma raiva tão grande, que só um boi manso pode saber o que é!” tirava aplausos da plateia. Este, junto ao auto sobre S. João Batista ficou em cartaz por anos, no repertório do noviciado.

O gosto pela leitura acompanhou-a sempre. Lia jornais, revistas e livros, inteirando-se das notícias do mundo. Lia obras espitiruais, discussões pastorais e teológicas, e queria estar a par das inovações da tecnologia. Quando chegou o FAX, pediu para ver seu funcionamento. O mesmo com a internet ou com qualquer novidade que aparecesse no mosteiro. Ia ao local da nova máquina para se inteirar do desafio trazido. Já na cadeira de rodas pedia que a levassem diariamente ao quadro de avisos e acompanhava todos os passos da vida comunitária. Se houvesse reunião marcada enviava pedidos de licença por não conseguir participar, mas não pedia as principais cerimônias da comunidade como entradas no noviciado e profissões. Quase até o fim estava presente na Missa dominical e nas vésperas de cada dia. No ano passado anunciou que começaria a reler a Bíblia inteira, o que fez pontualmente a cada dia.

O humor de Ir. Rachel era notório! Até em ocasiões difíceis de sua saúde, uma piada aliviava o ambiente. Esta presença de espírito e tiradas cômicas ajudaram a comunidade a vida inteira, junto à sabedoria e prudência de seu conselho. Foi assim, que mesmo já na fases do eremitério, pedimos que não deixasse de frequentar as reuniões da comunidade. Sim, chegou a hora de dar mais um passo em direção à entrega total a Deus. O chamado à vida eremítica era cada vez mais forte. Já de Salvador, em 1981, fez uma primeira tentativa por pouco mais de um ano em Nova Friburgo. Mas ainda não era a resposta. Finalmente, apesar de sua forte capacidade de comunicação, com o apoio de Madre Joana, prioresa de Salvador, passou a viver parte de seu dia no eremitério construído no terreno do mosteiro em 1984, a Cela Maranatha, aumentando gradativamente o tempo de permanência no mesmo. Ia pela manhã, após a Missa, trabalhava na máquina de tricô e no jardim, lá fazia as refeições e voltava para as Vésperas com a comunidade. Fornecia a toda a comunidade os agasalhos de que se precisava e ainda fazia peças de tricô para a loja. Dormia no mosteiro. Aos domingos, participava da vida comunitária integralmente. Depois de alguns anos, iniciou uma correspondência com dois eremitas do Brasil, a Ir. Belém, do Convento da Solitude, em Curitiba, e Dom Frei Vital Wilderink OC. Bispo Emérito de Itaguaí, RJ.

Assim viveu Ir. Rachel, até a diminuição gradativa de suas forças, vendo-se obrigada a deixar o eremitério e passar a viver seu dia todo dentro do mosteiro, o que lhe custou uma renúncia sentida. Quando, após períodos de internação, foi morar na enfermaria, dependendo de cuidados contínuos, tudo ofereceu com grande paciência. Recebia as visitas das irmãs com alegria e rezava por todas as intenções que lhe pediam. Mesmo debilitada, continuava sua missão de pedagoga e evangelizadora. Por onde quer que passasse deixava em todos que dela cuidaram uma mensagem de vida, despertando admiração e confiança de médicos, enfermeiros, cuidadoras, que com ela partilhavam suas alegrias e tristezas.

Os últimos anos de sua vida foram marcados por contínuas internações em hospital. Recuperou-se da última internação além das expectativas e celebrou com alegria na intimidade da família monástica, os  90 anos. O sobrinho Lino estava presente. Mas as forças declinavam. Pode ser cuidada em casa graças ao Home Care que lhe poupou o sacrifício de remoções, muito dolorosas para sua coluna prejudicada pela forte osteoporose. A vinda dos sobrinhos neste período foi um bálsamo para seu coração, bem como as visitas do Sr. Cardeal Dom Geraldo e de Dom Abade Emanuel D’Able do Amaral OSB. Este a viu e ouviu muitas vezes e acompanhou o caminho da volta para a casa do Pai, bem como o irmão bispo, Dom Gregório Paixão e Padre João Cara, irmãozinho de Jesus. Outros sacerdotes e religiosos também a viram. Os funcionários do mosteiro, já aposentados, pelos quais tinha grande amizade vinham pontualmente vê-la. Também as crianças vizinhas. Quando a viam presente na Missa do Domingo, sua cadeira de rodas era envolvida pelas famílias que lhe queriam muito bem. Sem falar ainda o carinho da comunidade das irmãs. Suas enfermeiras dedicaram-se incansavelmente e tudo fizeram para ajudá-la. Foi assim que, rodeada, abraçada por nós, exalou seu último suspiro na manhã de 11 de março de 2014.

Deixou-nos fisicamente, mas continua a inspirar nossos passos no dia a dia, pelo testemunho que deixou impresso nos corações, de uma presença amiga e, mais ainda, pela forte intercessão de quem serviu a Deus por caminho reto até o fim! Damos graças a Deus por tudo!

A Cronista.

ALGUMAS FOTOS DA INFÂNCIA E JUVENTUDE

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Júlia com Rachel e Tio Nininha, irmão da Júlia

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Ena a esquerda, direita Rachel

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A esquerda Lia, centro Rachel, direita Ena

Neneo com Lia

Rachel assentada em frente à mãe, Júlia, atrás Neneo com Lia no colo, Ena à esquerda, a direita uma amiga

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Rachel de costas, o maior é o Papai, Luiz, Ena a esquerda, Lia de frente, um amigo Paulino, e o cão Vesúvio

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Rachel e a mãe Júlia, em Juiz de Fora, no sítio Marianinha

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Rachel, Júlia e Neneo

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Em Viçosa, 1957, a primeira à direita

CARTAS QUE GUARDEI COM MUITO CARINHO

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Transcrevo para facilitar a leitura

Juiz de Fora, 9 de novembro de 1958

Minha querida Regina Helena,

Já estava me preparando para escrever-lhe dando os parabéns pelo boletim de setembro, quando recebi o de outubro. Foi para mim a maior alegria de 1958 ver as bonitas que você alcançou e, principalmente, através de sua carinha, apreciar suas boas disposições. Pode dizer a Irmã Cirênia que tenho rezado muito por ela, pela bondade em interessar-se pela Regina Helena, orientando-a e encaminhando-a com tanta dedicação. E você também deve fazer o mesmo. A gratidão é virtude rara, mas agradabilíssima ao Coração de Jesus.

Quanto as suas preocupações com o seu papai são justas e eu também me entristeci com esta notícia. Mas a misericórdia de Deus é infinita e o poder da oração é profundo e misterioso. Quem sabe N. Senhor está esperando a sua generosidade em aceitar bem a vida no internato que tanto lhe custa, para conceder a conversão do Lizote? Melhor do que oferecer a vida e dispor-se a morrer por outrem, é aceitar a vida tal qual ela nos é imposta pela Divina Providência, através da vontade de nossos pais. Acho que assim você encontrará um campo vastíssimo para fazer pequeninos sacrifícios diários, conhecidos só de Jesus e que O forçarão a atender às nossas súplicas. Sei que você me compreenderá, afastando todo o egoísmo que a faz pensar em si, dispondo-se ao mais difícil , quando se trata da salvação de uma alma tão querida quanto a de seu papai. Não nos preocupemos demais : seu pai é muito íntegro de caráter e movido da melhor das intenções; mais cedo ou mais tarde há de compreender o erro dos que procuram a Deus por caminhos falsos, como é o caso dos espíritas.

Procure sempre a Ir. Cirênia, sim? Você é muito nova e na sua idade é preciso que tenhamos alguém que nos oriente, nos repreenda e em quem tenhamos confiança. É uma grande graça de N. Senhor encontrar quem nos ajude a ser melhores, quem se interesse pelos nossos problemas e se disponha a dizer-nos sempre a verdade, isto é, tudo aquilo que precisamos ouvir. Seja muito dócil e amiga de todas as Irmãs, pois todas desejam o seu bem, mesmo que você não compreenda agora. Ajude as Irmãs em tudo que lhe for possível, especialmente rezando por elas, de um modo particular pela Revma. Madre Célia a quem você deve tanta gratidão.

Quero receber sempre suas carinhas, dando-me notícias de seus estudos, de suas preocupações e alegrias. Não se esqueça das são-geraldenses e envio um agradecimento especial à Márcia pelas orações que tem feito por mim. Diga-lhe que continue, sim?

Nas suas comunhões diárias e na hora do terço, peço a você que reze também por mim. Recomendo-a ao Coração de Jesus e Maria, para que a conservem sempre na santa graça divina, tesouro imenso que nunca devemos perder. A tia sempre amiga “in domino” Irmã Maria da Sta. Felicidade.

Transmita minhas recomendações a Revda. Madre Célia e meu abraço a todas as Irmãs. Agradeça à Irmã Olímpia a grande bondade em me enviando seus boletins mensais.

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Juiz de Fora, 5-4-1958

Minha querida sobrinha Regina Helena,

Só agora, terminada a Sta. Quaresma, é que posso conversar um pouquinho com você. Fiquei muito satisfeita com sua carinha, por vê-la entusiasmada e alegre. Como o tempo passa depressa, não acha? Já chegou a 3ª série e muito breve estará com um certificado nas mãos! Será que a Regina sabe aproveitar-se da grande graça de ter como Madrinha a Virgem Mãe do Céu?  Gostaria de receber uma resposta sincera a esta pergunta. Tem cultivado os talentos de que é depositária: inteligência, saúde, boa disposição, percepção dos fatos, etc. etc? É quase um exame de consciência que estou a exigir-lhe, mas, de vez em quando, é utilíssimo um “balanço” de nossas contas com Deus e nossa alma. Veja: nem todas que iniciaram a 1ª série em 1956 estão hoje na 3ª série com  você. Quantas graças a Deus, quantas Aleluias ao céu, nesta linda Páscoa de 58! Una-se aos Anjos que louvam a Jesus Ressuscitado e repita com eles do fundo dalma: Muito obrigada, Jesus, muito obrigada por tudo!

Quanto a sua vinda para o Carmo, não depende de mim, pos a Revda. Madre não permite que recebamos alunas internas, por ser muito pequena a Casa e poucas irmãs para vigilância das alunas. No externato, não há obstáculo, parece-me, a não ser por parte de seu pai, que com certeza e com razão não há de aprovar tal projeto. Já conversei com a Irmã Olímpia a este respeito e, no próximo dia 21, hei de conversar com seu pai que deverá vir a Juiz de Fora, conforme nos prometeu. Fiquei (….)mais “puxões de orelha” da tia Irmã?

Estude muito, seja amiga das Irmãs, ajude-as no que lhe for possível, principalmente com seu bom procedimento e simplicidade de trato. Cuidado com as companhias, pois aquele ditado é sempre certo: “dize-me com quem andar e dir-te-ei quem és!” Leia com atenção tudo que lhe peço nesta para não (….) dos meus “sermõezinhos”.

Quero pedir-lhe mais uma cousa: que faça um tríduo de comunhões para ajudar-me alcançar uma grande graça. Quando nos encontrarmos poderei contar-lhe o que é. Ofereça o terço na mesma intenção, pelo menos durante 3 dias. Recomendações às meninas de São Geraldo. Que a Virgem do Carmo a abençoe, proteja e guie. Em N.Senhor

Irmã Maria de Sta. Felicidade

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Juiz de Fora, 2 de maio de 1959

Minha querida Regina Helena

Que o bom Deus habite em nossos corações pela sua graça, durante todo este rico mês de Maio, em que a Mãe do Céu derrama

maternalmente bênçãos e mais bênçãos a todos que A invocam com fervor.

Recebi sua cartinha, mas seu conteúdo não me surpreendeu. São tão naturais estas inquietações e dúvidas…são visitinhas do bom Deus. Ele é que deposita no coração humano ânsias infinitas, pois, como diz Sto Agostinho, “fomos criados para Deus, para o Infinito, e só Nêle o nosso coração encontra descanso”. Tudo isto são sinais de predileção do bom Deus, pois há os que vivem satisfeitos e saciados neste mundo! Coitados, contentam-se com pouco! Quando se sentir assim, não deixe de procurar Jesus no Sacrário, de falar-lhe como a um Pai muito carinhoso. Depois faz muito bem em procurar quem possa esclarecê-la e ajuda-la. Você tem aí o Revm. Pe. Carlos, tão santo, tão dedicado e que também sabe compreender a mocidade. Procure-o, pois o ministro de Deus tem graça especial para dirigir as almas em meio aos escolhos do caminho. Pode escrever-me sempre que quiser, meu tempo deve ser mesmo empregado a favor da mocidade, não se preocupe. Hei de acompanhá-la em minhas orações, pois o bom Deus está sempre pronto a atender-nos em tudo que lhe pedimos. Quanto à dificuldade que sente em vencer-se, é tão antiga quanto o pecado de nossos primeiros Pais. Se você ainda tem o precioso presente que seu Pai lhe fez: O Novo Testamento”, procure lá na Epístola de São Paulo aos Romanos e leia o que diz o grande Apóstolo: “Porque não entendo o que faço; não faço o bem que quero, mas o mal que aborreço, esse é que faço”… “Porque o querer encontra-se ao meu alcance; mas não acho meio de o fazer perfeitamente”…(S. Paulo aos Romanos, Cap 7 vers. 15 e 18) Veja que o grande Santo também teve suas lutas, mas apesar de tudo, não desanimou e hoje é grande luz  que ilumina a Santa Igreja de Deus.

Recorra à Mãe de Deus, quando tiver tentação de responder às Irmãs…pense…como agiria a Virgem Santíssima em meu lugar? Eu como sua afilhada devo parecer-me com Ela!

Como falaria quando aluna no Templo de Jerusalém? Quais os traços de semelhança que já tenho com Maria estudante, da minha mesma idade? Na biblioteca das alunas aí de Viçosa, havia um belo livrinho que você devia ler e meditar: “Maria Santíssima, espelho da mocidade”.

Fiquei muito satisfeita de saber que você está jogando vôlei. Os esportes fazem um bem imenso à saúde do corpo e da alma. Continue, sim? Será um derivativo para seu vício de ler demais, descansa o cérebro e ativa a função de todos os órgãos.

Tem se encontrado tanto assim com a Miriam? Acho-a muito distinta e tenho certeza de que tudo que ela lhe falou era para seu proveito, pois Miriam já foi interna e conhece perfeitamente essas dificuldades, sabendo ser muito amiga das Irmãs

A Julinha está interna em Cataguases, ainda muito saudosa de Juiz de Fora, mas vai bem, graças a Deus.

Regina, não deixe de procurar a Irmã Cirênia, pois apesar de ter o máximo prazer em ajudá-la, eu estou longe…o que não é a mesma cousa. Quero sabe-la  muito amiga das Irmãs, sim? Não seja desconfiada, todas lhe têm verdadeira amizade e só querem fazer da Regina uma moça “cem por cento”

Tenho certeza de que a Irmã Celina e Irmã Jacinta não têm a mínima prevenção contra você. Quando a repreendem, é porque desejam vê-la melhorar, é porque a estimam tanto quanto eu, que fui quem mais a repreendeu, não é verdade?

Seria pedir-lhe demais, o exigir-lhe que lesse, todos os dias, ao menos um versículo do Novo Testamento? São palavras divinas que a farão conhecer e amar nosso Jesus, o Grande Amigode todas as horas. Escreva-me sempre, sim? Aproveite ao máximo deste mês, oferecendo diariamente à Mãe do Céu um pequenino sacrifício, flores agradabilíssimas ao Seu Coração! Reze por mim. Sempre amiga em N. Senhor, a sua

Irmã Felicidade

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MAIS ALGUMAS CARTAS E CARTÕES, SEMPRE BELAS PALAVRAS E LIÇÕES DE VIDA!

É com imenso prazer e saudades que revejo esta correspondência que, felizmente, não se perderam! Afirmo a todos que é uma leitura saborosa e de grande valor!

Não sei se vou conseguir manter uma ordem cronológica!!

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Para Laura

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Dedicatória deste cartão

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Dedicatória do cartão acima

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A monja ajuda as crianças a tirar água do poço, Ilha da Maré

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O Claustro do Convento de Salvador em 1985

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+Pax!

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Querida Laura,

Soube que a Mariquinha voltou “à Casa do Pai”, alegria para ela que, tendo cumprido a sua missão, começa agora a verdadeira vida sem fim junto de Deus. Alegria para ela, mas saudades para os que ficaram. A dor é mistério. Falar a você com minhas palavras não seria nada. Mas a Escritura é a Palavra de Deus. E ela está cheia de mensagens de esperança para os que perdem os entes queridos. Assim por ex. na 1ª Cor., todo o Cap. 15, do qual extraí alguns: “Eis que Cristo ressuscitou dentre os mortos, primícias dos que morreram. Assim como por um homem veio a morte, é por um homem (Cristo) que vem a ressurreição dos mortos. Como em Adão todos morrem, assim também em Cristo todos reviverão”(Vs 20-22).

Ou então 2ª Cor 1,3-4 “Bendito seja Deus e Pai de N.S .Jesus Cristo, o Pai das misericórdias e o Deus de toda consolação com que nós mesmos somos consolados por Deus, possamos consolar os que estão em qualquer angústia.”

Peço a Deus que encha de paz seu coração na certeza de que em breve todos nos reuniremos novamente na “Casa do Pai”.

Diga ao Lizote que tenho recebido todos os recortes que ele e a Ena me enviaram. Assim posso acompanhar os passos e as palavras de nosso Santo Padre em sua caminhada de apóstolo pelo mundo, dando-nos o ex., como Lizote lembrou, de que nossa vida nos foi dada para a colocarmos a serviços dos irmãos. Li a carta do Lizote para a Ir. Felicidade para reavivarmos mais ainda nossa missão de serviço. Assim, de modo geral, o Mosteiro deve oferecer a nossos irmãos um local de encontro com Deus, de silêncio, de reflexão, de uma parada para refazer as forças. Além disso procuramos ajudar os que nos procuram para ensinar um tricô, uma pesquisa escolar, um curativo nos dedos machucados dos vizinhos, para escutá-los em suas preocupações, etc, etc.

Assim por ex. ontem, foram tantos os que nos procuraram para ouvir uma opinião sobre a tragédia de Cantagalo. Vocês devem estar a par. Um fanático de uma seita luciferiana rapta uma criança de 2 anos para tomar-lhe o sangue. Foi preso, mas a cidade, infelizmente, resolveu fazer justiça, por suas próprias mãos. Invadiram a cadeia e mataram os dois responsáveis com um sadismo equivalente aos dos criminosos. Só Deus julga e a gente nunca sabe até onde vai a responsabilidade de cada um.

Quanto ao nosso Mosteiro, penso que em breve iniciaremos a construção. Como será muito simples penso que, antes do fim do ano ficará pronto. O engenheiro de B.H. que nos visitou, Luis Eduardo, também não é construtor, é químico! Mas deu-nos boas pistas e ficou de consultar um seu amigo construtor e enviar-nos algumas sugestões. Tirou inúmeras fotografias do terreno para levar ao amigo. Não dispensamos a visita da Goreti, pois é sempre bom ouvir o que os entendidos nos aconselham.

Parabéns a Regina Helena pelo trabalho em Bicas. Parabéns ao Ary pelo grande grupo de alunos e a Daniela pela sua apresentação como violonista. Gostaria de continuar a receber as cartinhas dela.

A Ena recebeu a visita de umas jovens que aqui estiveram? Ficaram de levar-lhes nossas notícias. Foram os primeiros moradores de nosso terreno, pois armaram lá sua barraca para acampar. Uma do grupo foi minha aluna e foi quem trouxe o resto do grupo. Fazem parte de um coral e ficaram de voltar para cantar na 1ª Missa no Mosteiro definitivo.

Quando estiverem com os filhos e netos ausentes transmitam-lhes meu abraço.

Laura, estamos rezando com você e por você.

Nosso abraço carinhoso, pedindo a Deus que lhe conceda a cada dia suas graças de um aumento de fé, esperança e caridade que a sustentem na caminhada.

Sua irmã Rachel

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+Pax!

Salvador, 28-8-1981

Querida Laura,

É a minha 1ª carta baiana. Você fica encarregada de transmitir a toda a família nossas notícias.

Como sabe, vim toda “chique” de avião, gastando em 2 horas de vôo o que a maioria dos nossos irmãos leva um mês a ganhar! E quando ganha…Como poderia estar com a consciência tranquila? Já avisei ao Paulo ser esta a última vez que aceito seu oferecimento de passagem de avião. Seria uma incoerência com o meu voto de pobreza, não é? Posta de parte a observação acima, a viagem foi ótima, apesar do dia nublado. Penso que se viajássemos sobre os polos a paisagem seria a mesma: a brancura de um mar de nuvens. Só depois de Ilhéus, é que o céu se dasanuviou e pudemos ver o mar, mas isto quase chegando a Salvador. Do aeroporto, onde me esperava a Ir. Marta Beatrice, viemos no carrop do Mosteiro de São bento por uma estrada que não entra em Salvador. Em 25 minutos estávamos em casa. O nosso novo Mosteiro é muito bonito. Após ter contemplado durante 2 anos e meio as montanhas fluminenses, agora contemplarei diariamente o mar, apreciando o vento que suaviza o calor baiano. Enquanto lhe escrevo, tenho que segurar bem o papel, pois a brisa forte é um “perigo” para as coisas leves.

Foi uma alegria receber em B.H. a visita da Regina Helena e Conceição e conhecer o César e a Flávia. Ficarei agora à espera da Conceição aqui em Salvador. O elétrico passa bem em frente ao Mosteiro, quem sabe o Juninho nos dá de presente uma estação aqui no bairro de Coutos!!!!

Conversei muito com a Regina. Parabéns pela filha que vocês formaram! Que maturidade, que equilíbrio psicológico, que fé diante dos contratempos da vida! São dons raros hoje em dia! Achei muito tranquila e objetiva a sua separação do Ari. Não havia outro caminho. O matrimônio, apesar de indissolúvel, não é um absoluto. A Regina está bem preparada para enfrentar sozinha, com o auxílio de Deus, é claro, a tarefa de educar e orientar os 5 filhos. Preocupa-me muito mais o namoro precoce da Daniela. É pena que ela queime etapas!

Estou com todos vocês na oração. “ O Senhor é a minha luz e a minha salvação, por que temeremos?” diz o Salmo 26. Vamos viver na alegria e na confiança em Deus  o momento presente e entregar o futuro nas mãos de Deus.

Aguardo aqui a sua visita com o Lizote. Para vocês, meu abraço saudoso.

Ir. Rachel

Fiquei muito alegre de saber que o Lizote continua a mandar os jornais para S. Sebastião do Alto.

CONTRIBUIÇÃO DO JOSÉ REINALDO DA MOTTA

Para quem não sabe, meu irmão caçula!

Ré,

Foi muito emocionante ver as cartas da tia Rachel para você. Pena que para os historiadores do futuro só restarão as msgs eletrônicas que, ainda se conservadas, não são reveladoras do pensamento e da personalidade de quem as escreve, como são (eram?) as cartas.

Para ajudar na recordação da tia, veja se essa carta anexa contribui. Não sei se está muito extensa para um blog. Transcrevo para facilitar a leitura:

Observação: a Ordem de São Bento é conhecida pelo lema “Ora et labora”, “reze e trabalhe”. O que muitos não sabem é que isso é o “método”, o caminho, mas o objetivo é alcançar a Pax, a Paz, aquela que Jesus Cristo deixou aos apóstolos e a nós. Por isso as cartas da Rachel,depois que ela se tornou beneditina, sempre a têm como saudação e voto aos destinatários.

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”  + Pax!

Salvador, 3-6-90 (Domingo de Pentecostes)

“Amanhã encontrá-la-ei; oh! a verdade aparecer-me-á com evidência e possui-la-ei….” (Santo Agostinho, Confissões, pág. 147)

“Tenho ainda muito que voz dizer, mas não podeis agora suportar. Quando vier o Espírito da Verdade, ele vos conduzirá à verdade plena.” (Ev. de S. João, 16, 12-13). Palavras de Jesus aos Apóstolos em seu discurso de despedida na Última Ceia”.

Zé Reinaldo,

As palavras de Santo Agostinho citadas acima referem-se ao seu período de busca: na filosofia, na astrologia, no maniqueísmo persa, na busca desenfreada de prazeres carnais, etc., etc.

Mas Jesus nos diz que o caminho é outro: só a inteligência iluminada pelo Espírito Santo é capaz de alcançar a Verdade. Deus só se revela aos que o buscam com a simplicidade de uma criança.

Penso que Santo Agostinho será um bom guia para você. Graças a Deus você não teve uma vida de libertinagem como o santo, mas a busca de um sentido para a vida é a mesma. Muitas das interrogações da sua carta encontram resposta nas “Confissões” de Santo Agostinho. O exemplar que tenho foi traduzido em Portugal: Livraria Apostolado da Imprensa. Penso que você o encontrará nas livrarias das Paulinas. Santo Agostinho viveu no séc. IV, nasceu em Tagaste, África e foi professor durante quase toda a sua vida. A título de esclarecimento menciono alguns capítulos: O apelo à verdade – Seduzido pelo maniqueísmo – A sedução da astrologia – A perda de um amigo  (sua experiência?) – Luta da alma em busca da verdade – Do platonismo à Sagrada Escritura – Miséria da vida humana, etc, etc.

No prólogo do livro citado, o tradutor comenta toda a influência do platonismo sobre Sto. Agostinho: “Uma de suas maiores glórias consistiu em adaptar aos ensinamentos cristãos os preceitos platônicos, assim como Sto. Tomás de Aquino, passados séculos, fez ao aristotelismo (Prólogo, § 10, pág 21).

Mas a fonte das fontes em que você deve procurar a luz é a Sagrada Escritura, em que Sto. Agostinho também a encontrou.

Se seus cr. ou cz. não estiverem congelados, ao receber esta, compre no mesmo dia a Bíblia de Jerusalém, Edições Paulinas. A nossa que está aberta aqui em minha frente é edição de 1985. É o que há de melhor em termos de tradução da Bíblia, com notas esclarecedoras ao pé das páginas. Não leia a começar do Antigo Testamento. Comece pela 1ª Epístola de S. João: “O que era desde o princípio, o que ouvimos, o que vimos com nossos olhos, o que contemplamos e o que nossas mãos apalparam do Verbo da vida… é o que vos anunciamos” (1ª Ep. de São João 1,1-2).

Religião não é ciência, não são ritos, não é doutorado…É a descoberta experiencial de uma pessoa: Cristo Jesus. Só ele é o sentido de nossa vida, a resposta viva às nossas indagações. Se eu o descubro como S. João o descobriu deslumbrado, tudo se ilumina e tem um sentido novo.

Depois da 1ª Epístola de São João passe para os 4 Evangelhos, às cartas de São Paulo, etc. [Para ler] o Antigo Testamento, você compreenderá melhor se houver lido primeiro o Novo Testamento. Nele a chave das profecias, da experiência de deserto do Povo de Deus, etc.

Não se deixe seduzir pelas respostas prontas do espiritismo. Não atribua aos mortos fenômenos que a parapsicologia explica razoavelmente bem como forças dos vivos: levitação, telepatia, manifestações em línguas desconhecidas, etc., etc. Procure aí o esclarecimento científico e não, por desconhecimento, crenças míticas que ficam bem aos nossos antepassados de alguns séculos atrás.

Um parapsicólogo que nos deu algumas aulas, indicou-nos o livro de Renold Blank: Viver sem o temor da morte (ed. Paulinas) para entender um pouco o mistério da morte. Ainda não o li, não sei se vale a pena.

Sabe que eu gosto muito do Carlos Drummond de Andrade? Tenho uma boa coleção de recortes de jornais sobre ele. Linda a poesia “Combate”. Sabe que os místicos cristãos comparam a vida espiritual ao combate de Jacó com Deus? (Gênesis, 32 – 23-33). Retribuindo, envio-lhe a última poesia de C.D.A: A PALAVRA.

No fundo, o propalado ateísmo de C.D.A. era a angústia do sentido da vida. Esta “Palavra” é o verbo – o Cristo, pressentido mas não reconhecido.

Sua carta está muito boa. Esta descoberta nunca virá de fora…

“Eis que habitáveis dentro de mim, e eu lá fora a procurar-Vos!” (Sto. Agostinho, Confissões, pág. 266).

Um abraço para a Solange e Daniel.

Que os três sejam uma imagem viva do amor que une a SS. Trindade, são os votos da tia,

Ir. Rachel, OSB”

poesia-drumond

A Palavra

Carlos Drummond de Andrade

Já não quero dicionários

consultados em vão.

Quero só a palavra

que nunca estará neles

nem se pode inventar.

Que resumiria o mundo

e o substituiria.

Mais sol do que o sol

dentro do qual vivêssemos

todos em comunhão,

mudos,

saboreando-a.

Participação do falecimento da Irmã Rachel Roxo da Motta

Mais uma linda e emocionante carta da Tia Rachel endereçada á família

Cartão endereçado a mim, Regina com uma cartinha interna




Para minha mãe, Laura

Carta para o papai, seu irmão, Luiz Roxo da Motta
Cartão de Natal para mim
Carta da Tia Rachel para mim, Regina
Para o irmão, Luiz Roxo da Motta – meu pai